As Aventuras de Nando & Pezão

“A Garota dos Cabelos Verdes”

Último Capítulo – Acaba Bem. Mas pra Quem?

— O que aconteceu? — perguntei.

— Está vendo aquele Fiat 147 preto vindo lá atrás?

Olhei com calma e o localizei. Vinha a toda velocidade. Quero dizer, tentava vir a toda velocidade, né? Afinal de contas é um Fiat 147.

— Sim, estou vendo.

— É o Milton!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

— Santa pixirica.

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— Não acredito! — disse Caroline, apavorada. — Justo no dia em que resolvo curtir a vida eu vou morrer.

— Vira esta boca pra lá, mina!

— Você não conhece o Milton.

— Pelo que eu sei ... você também não.

Ela ficou quieta. Olhei novamente pelo retrovisor e o Fiat 147 continuava nos perseguindo. Maldito Fusca lerdo dos infernos!!! Anda, porra!!!

— Sei que não é o melhor momento — eu disse, com um olho na Caroline e outro no retrovisor. — , mas me diz uma coisa ... Você e o irmão gêmeo do Maguila chegaram a ... ?

— Trepar?

— Isso.

Caroline deu uma puta pisada no freio. Se eu não estivesse usando cinto teria voado pela janela.

— Caraaaaaaaaaalho!!! — falei, meio zonzo. — O que aconteceu?

Caroline estava mais vermelha que um pimentão. Bufava feito um touro enlouquecido. Seu corpo tremia todinho.

— Uma besta entrou na minha frente — e Caroline apontou para um vulto atravessando a rua.

Meu, não acredito no que meus olhos estão vendo. Vamos ver se vocês adivinham quem a Caroline quase atropelou. Ele está vindo pra cá. Putz!!! Fodeu, acho que ele me viu.

— Eu nunca tinha visto uma joaninha tão grande assim, meu camaradinha!

Ele mesmo ... Pigmeu. Caroline ficou uma fera com o maluco. Será que ele vai apanhar de mulher outra vez ? Fala sério, coitado do maluco.

— Você não olha por onde anda, sua besta?

Olhei para trás e vi o Fiat 147 parado alguns metros atrás de nós. De repente Milton pulou fora do carro. Meu, o que é aquilo na mão direita dele?

— O Milton está armado!!!!!!!!!!! — gritei, desesperado. Melhor dizendo, com um puta cagaço.

Antes que Caroline pudesse dizer alguma coisa ouvimos o primeiro disparo. Pa!!! A bala passou raspando a orelha do Pigmeu. Acho que o maluco nem percebeu.

Antes que Milton chegasse a disparar novamente nós abrimos a porta do Fusca e puxamos o Pigmeu pra dentro. Saímos zunindo dali. O maluco capotou no banco de trás feito um saco de batatas.

— Agora pisa fundo!!! — gritei para Caroline.

— Meu, sinistro o bagulho!!! — disse Pigmeu, examinando o Fusca com olhos curiosos. Olhava tudo com espanto. Provavelmente deve estar pensando que está no interior de uma joaninha gigantesca ... ou sei lá!!! Cabeça de maluco é foda.

Outro tiro. Pa!!! Agora a bala acertou um pedaço da traseira do Fusca. O som foi aterrorizante, pensei que tinha chegado a minha hora.

— Abaixa aí, Pigmeu! — gritei pro maluco.

— O que foi, camaradinha? Relaaaaaaaaaxa.

Outro tiro. Pa!!! Mas este não acertou em lugar algum. Bom, aparentemente não. Só falta eu abrir o jornal de amanhã e dar de cara com o título: "Bala perdida mata cinco e fere outros dois".

— Relaxar o escambau!!! — gritou Caroline, fula da vida. — Você não está vendo que estão atirando na gente? Você quase levou um pipoco na orelha, seu idiota!

— Tiro? Ra ta ta tá?

Olhei para o maluco e fiz que sim com a cabeça. Ele ficou me olhando com aqueles olhos vermelhos e sem expressão. Depois de uma longa pausa ele disse:

— Vocês roubaram o bagulho de alguém?

— Não, Pigmeu.

— Então relaxa, camaradinha, estão atirando em mim então.

Antes que eu pudesse evitar ... o Pigmeu deu um tapão na cabeça da Caroline. Nem preciso dizer que ela ficou puta da vida, né?

— O que foi isso, meu???? — aí ela olhou pra mim, vermelha de raiva. — Seu amigo aí não tem noção do perigo, Nando. Se ele fizer isso outra vez eu acabo com a vida dele. Aí ele vai fumar um baseado lá na puta que o pariu!!!

Olhei para trás e fiz cara feia para o maluco. Ele nem me deu bola, apenas disse:

— Já te contei que odeio joaninhas? Tinha uma enorme na cabeça da tua mãe.

Na hora olhei para Caroline, ela ficou vermelhinha de raiva. É hoje que o maluco apanha outra vez.

— Mãe o escambau!!!! — gritou Caroline, quase largando as mãos do volante.

A Caroline que me perdoe, mas eu caí na gargalhada. Até esqueci que tinha alguém atirando em nós. Ri tanto que parecia uma hiena passando fio dental. Caroline mostrou aquele famoso dedo para mim ... e pelo retrovisor mostrou para o Pigmeu também. O maluco nem percebeu, estava olhando concentradíssimo para o teto do Fusca. Provavelmente observando uma borboleta.

— Está vendo o Milton? — perguntou Caroline.

— Não — respondi, aliviado. — Acho que escapamos.

— Ontem me aconteceu um bagulho irado, Nando. — disse o maluco. Lá vem merda. — Quase fui atropelado por uma joaninha gigante.

— Se liga, Pigmeu, não foi ontem. E não era uma joaninha gigante, era o Fusca.

Viajei agora. Explicar alguma coisa para o Pigmeu é a mesma coisa que tentar explicar física quântica para um bebê de oito meses. E pior, um bebê emaconhado.

— Eu deveria ter atropelado mesmo! — disse Caroline, irritadíssima. — Se eu tivesse atropelado não teria levado aquele tapa na cabeça. Meu, está doendo!!!

— Tadiiiinha! — e fiz carinho na cabeça dela.

Agora foi minha vez de levar um puta tapão na cabeça. Maldito Pigmeu do caralho.

— Você viu o tamanho da borboleta, camaradinha? Ela estava ali quietinha e de repente deu um rasante bem na tua cabeça.

Filho da mãe!!! Começo a concordar com a Caroline. Deveria ter atropelado mesmo. Maldito tapa que dói, porra!!! Ele pega a gente despreparado. Meu, se a gente parar pra analisar ... o Pigmeu foi o inventor do "Pedalada, Robinho" ... hahaha. Pedalada, joaninha!

Quando percebi já estávamos deixando a cidade. E nada de Milton. Ufa! Bom, o carro do cara era um Fiat 147, né? Pior ... só se ele estivesse de velotrol.

— Pra onde estamos indo? — perguntei, só por mera curiosidade.

— Sei lá, só sei que pra casa eu não quero ir agora.

E Caroline pegou a estrada. Pra onde a gente ia eu nem me preocupei naquele momento. Era muita coisa pra assimilar. Eu ainda estava com a imagem da bala zunindo a orelha do Pigmeu. Falando nele, olhei para trás e o coitado estava roncando, esparramado pelo banco do Fusca. Parecia um gnomo bêbado. Porra, já imaginaram se a bala acerta o maluco bem na nossa frente? Ia voar pedacinho de Pigmeu por todos os lados, inclusive dentro do Fusca. Pra limpar ia ser uma maravilha. Bom, pra quem já recebeu uma vomitada depois do almoço ... levar um banho de restos mortais nem seria tão anormal assim.

Alguns minutos depois Caroline começou a puxar conversa. Aparentemente estava mais calma.

— Seu amigo aí é meio lelé da cuca, hein!

— Você ainda não viu nada. O Pigmeu é o maior figura que eu já conheci.

— O tapa que ele me deu está doendo até agora — e passou a mão na cabeça. — Fala sério!

— Isso é que é foda nele, mas fora isso o coitado é inofensivo.

— Deve fumar e cheirar todas.

— Com certeza. Ele precisa parar com isso, o maluco agora é papai.

— Não acredito — e Caroline começou a rir. Finalmente um sorriso! Ela tem uma boca tão gostosa.

— Ele é o pai do Rodligo.

— Como? — ela me olhou espantada.

— Rodligo é o nome do guri.

— Rodligo? Não seria Rodrigo?

— É uma lonnnnnnnnga história.

Estávamos no meio da estrada e a noite começava a cair quando o Fusca ficou sem combustível. Putz! Era só o que faltava. Caroline foi parando lentamente a bagaça no acostamento. Senti-me como o Rubinho. Pelo menos na cor a Ferrari e o Fusca da Caroline são parecidos.

— Fodeu — falei, desapontado.

— Só espero que o Milton não tenha seguido a gente.

— Putz!!! Eu tinha até me esquecido dele.

Comecei a ficar preocupado. Caroline tinha razão. E se o cara ainda estiver atrás de nós? Nada pra mim é assim tão fácil, né? Vocês sabem muito bem disso. Meu, estou muito jovem pra morrer ... não é justo!!!

De repente Pigmeu começou a gritar feito um louco:

— Não, Praga!!! Fala pra ele, Xuxa!!! Não enfia isso no meu cu, Praga!!! Praga, não!!!

Eu, hein!!! O Pigmeu tem pesadelos com a Xuxa e o Praga? Faltou o Dengue e as Paquitas, né? Hahaha ... Se o Pigmeu já viaja acordado, imagine sonhando. Ninguém merece.

Dei um tapão no maluco e ele acordou. Estava molhado de suor.

— Acorda aí, Pigmeu! É só pesadelo, mano. Não tem nenhum Praga.

— O que aconteceu, camaradinha?

— Estavam tentando enfiar alguma coisa na sua bunda.

Pigmeu arregalou seus olhos vermelhos.

— A Xuxa é sinistra, camaradinha. Quando eu era pequeno fui no programa dela e o Praga roubou o meu sanduíche de mortadela. Corri atrás dele. Sorte dele que eu não alcancei. Eu ia enfiar a mortadela no cu dele. Odeio joaninhas, camaradinha, odeio!!!

Meu, será que acabamos de descobrir a origem das joaninhas na vida do Pigmeu? Hahaha ... Putz! Deira pra lá.

Celular tocando. Bom, o meu é que não é.

— E agora? — disse Caroline, espantada. — Deve ser o Milton.

Ela abriu sua bolsa e pegou o celular. Suas mãos tremiam.

— Sua mãe é gostosa, amigo — disse Pigmeu.

Caroline apertou o celular com força e por pouco não jogou na cabeça do Pigmeu.

— Eu já disse que não sou mãe de ninguém, caramba!!!

E atendeu o celular:

— Alô. Mãe? Calma, mãe! Sim, estou bem ... estou bem!

— Nando — disse Pigmeu. Olhei para trás e ele estava apontando para a cabeça de Caroline. Putz, outra vez não!!!!! A Caroline vai espancar o maluco.

— Fica na tua, Pigmeu — vi ele levantando a mão direita para o tapão. — Nem se atreva!!! Fica na tua, véio! Ela te mata!

Caroline nem percebeu meus gestos para o Pigmeu; continuou conversando com a mãe pelo celular:

— O quê? Enforcado? A senhora tem certeza? Enforcado? Então ele morreu?

Quem morreu?

Caroline fez uma cara de espanto como eu nunca tinha visto. Depois deu um sorriso pra mim, e disse:

— O Milton está morto. Depois de atirar na gente ele voltou para o bar. Quando a polícia chegou ele se suicidou. Amarrou uma corda no pescoço e ... sploft!

— Sploft?

— Sploft! Morreu. Agora fica quieto! Minha mãe não pode saber que você está aqui comigo. Se ela descobrir ... aí eu serei a próxima a fazer sploft. — Caroline pegou novamente o celular e retomou a conversa: — Mãe, fica calma, eu juro que estou bem. Avisa a polícia que eu não estou desaparecida. Eu estou na casa de uma amiga. Não, a senhora não a conhece! Calma, mãe! Amanhã cedinho eu vou voltar pra casa, não se preocupe. Eu estou bem, nunca estive tão bem em toda a minha vida! Eu sei que o Milton era meu noivo, mãe! Mãe, mãe, escuta com atenção, eu não gostava dele! Eu sei que não é motivo pra eu ficar contente com a morte dele, mãe! Eu sei, mãe! Calma, mãe, eu não vou morrer solteirona, mãe! Mãe, calma! Volto pra casa amanhã, OK? Beijão. Tchau.

E Caroline desligou o telefone.

— Puta merda! — disse ela, jogando o celular dentro da bolsa. — Minha mãe me deixa maluca. Ela queria o casamento de qualquer jeito. Eu, hein!

— Será que a sua mãe não quer namorar comigo, Nando? Ela é bem ...

Antes que Pigmeu pudesse terminar a frase Caroline pegou sua bolsa e deu-lhe uma bordoada que doeu até a alma. Ela deu com tanta força que pensei que ia arrancar a cabeça do maluco fora. Juro pra vocês, se Caroline tivesse uma arma dentro da bolsa teria metido todas as balas na testa do maluco. Ela ficou muito irritada. Após a bolsada no Pigmeu ela abriu a porta do Fusca e saiu batendo os pés na estrada. Bateu a porta do Fusca com tanta força que cheguei a pensar que o coitado desmontaria.

— Sua mãe é nervosa, camaradinha.

— Pigmeu, cala esta boca!!!

E saí do carro também. Dei a volta e fui até Caroline. Peguei nas mãos dela e lhe beijei o rosto.

— Você está bem?

— Estou. É que este maconheiro debilóide me irrita tanto!

— Eu sei, eu sei, mas esquece o Pigmeu.

Agarrei sua cinturinha e lasquei-lhe um puta beijão gostoso. Um carro passou pela estrada e começou a buzinar feito louco. Depois ouvimos alguém gritar:

— Aê, gostosa!!! Come logo, mané!!!

Mas não demos atenção, continuamos nos beijando. Estava bom demais. Após o beijo ficamos abraçados por alguns segundos ... em silêncio. Até que Caroline disse:

— Pobre Milton, acho que ele gostava mesmo de mim.

— Ah, gostava ... gostava tanto que atirou em você umas três ou quatro vezes só.

Ela começou a rir. Depois me deu um soco no braço.

— Bobo! Quem garante que ele não atirou em você? Afinal de contas quem comeu a noiva dele foi você, não eu.

— Mas foi você que deu a bundinha da noiva dele pra mim. Se analisarmos bem a culpa foi ...

E Caroline me beijou outra vez. Foi um beijo tão quente que fiquei de pau duro em poucos segundos. Ela agarrou minha bunda e depois arranhou minhas costas. Se o Pigmeu estiver assistindo isso deve estar se masturbando. Ou morrendo de nojo. O maluco acha que a Caroline é minha mãe, né? Fala sério.

O beijo terminou e Caroline deu dois passos para trás.

— Lembra do primeiro item da minha lista? — disse ela, fazendo uma puta cara de sem-vergonha.

— Ahã! — aposto que a minha cara também não foi de santo.

De repente Caroline começou a tirar a roupa. Aaaaaaaooooooo!!!

— Meu, e se passar um ônibus cheio de gente?

Ela nem se importou com o que eu disse. Continuou se despindo ... até ficar peladinha. Foda-se, estrada deserta ou não ... eu não quero nem saber. Corri até ela e a agarrei feito um animal no cio. Apertei suas coxas com tanta força que devo ter deixado muitas marcas.

— Eu quero no capô, vem! — ela sussurrou no meu ouvido.

— O Pigmeu vai ver tudo de camarote.

— Estou pouco me lixando. Vamos mostrar pra ele do que a sua mamãezinha é capaz, vem!!!

— Mamãezinha? Putz! Não fala assim que o Nando Júnior murcha!!!

— Murcha não, meu lindo! Vem!!!

Mesmo excitado pra caralho eu confesso que fiquei sem coragem de tirar a roupa ali na estrada. Meu, fala sério, isso aqui não é uma daquelas estradas desertas que a gente vê nos filmes. Esta estrada liga minha cidade com as cidades vizinhas. Pode não ser assim tão movimentada quanto uma Fernão Dias, mas também não é totalmente deserta. 

Bom, o máximo que consegui fazer foi abaixar o zíper e botar o Nando Júnior pra fora da gaiola. E foi o suficiente, né? Só lamento termos transado sem camisinha. Estávamos tão empolgados que acabamos nos esquecendo deste detalhe. Bom, agora já foi. E foi bom pra caralho!!! Durante a transa eu só me recordo de um caminhão passando a toda velocidade. Mas acho que o motorista nem reparou na gente. Acho que foi bom não ter abaixado a calça, afinal de contas um bundão branco e cabeludo deve chamar a atenção, né?

Quando terminamos estávamos exaustos. Pelo menos eu estava. E todo dolorido também. Meus joelhos doíam muito.

Caroline vestiu-se e voltamos para o Fusca. Pigmeu ficou me encarando, depois fez sinal com a mão para que eu me aproximasse dele. Depois que eu o atendi ele sussurrou no meu ouvido:

— Camaradinha, eu não queria falar, mas tinha um cara estrupando a sua mãe.

Não me controlei, comecei a rir feito uma hiena com seborréia. Não sei o que foi mais engraçado ... o "estrupando" ou a cara que o maluco fez quando me contou.

— O que este debilóide te cochichou aí? — perguntou Caroline, ajeitando o cabelo pelo espelho retrovisor.

— Deixa pra lá, Caroline, nem compensa.

— Deve ter gostado do nosso desempenho. Feio deste jeito, ele não deve pegar nem gripe.

— Pior que já vi o Pigmeu com muita mulher gostosa.

— Fala sério, hein! Só depois de muita maconha mesmo.

— Você me empresta o celular?

— Claro, mas vai ligar pra quem?

— Vou pedir pro Pezão vir pegar a gente, né?

— Mas e o meu carro?

— Fala sério, quem roubaria esta lata velha?

Putz! Eu não deveria ter dito isso. Caroline me deu uma senhora bolsada na cabeça. Doeu, viu? Doeu mais que o tapão do Pigmeu.

— Nossa, mano, sua mãe matou as cinco joaninhas iradas que estavam andando na sua testa.

Nem falo nada.

Peguei o celular da bolsa da Caroline e liguei para o filho da puta do Pezão. Será que aquela coisa ainda está viva? Bem que o Pezão poderia ter encontrado aquela bala perdida do Milton, né? Mas que acertasse no saco. Só um susto, pra ele ficar esperto.

— Fala — ele atendeu.

— Fala o caralho!!! Enfia o dedo no cu e assovia o hino da Argentina!!!

— É você, seu bosta?

— Bosta é a puta que te pariu. Escuta aí, estou precisando de um favor teu.

— Favor? Fala sério, eu lá tenho cara de quem faz favor pra alguém? Se liga.

— Porra, Pezão, quebra o galho.

— Quem quebra o galho é o maçado do Jô Soares.

— Eu estou preso aqui naquela estradinha perto da rotatória.

— Meu, sua mãe já me ligou umas duas vezes atrás de você. A velha está preocupadinha com o bebezinho dela.

— Putz!!! Meu, se ela ligar outra vez diz que eu estou bem. Diz que eu ....

E acabou o crédito da porra do celular.

— Puta merda!!! — fiquei irado, é claro. Olhei para a Caroline — Por que você não me avisou que tinha pouco crédito?

— Você não me perguntou.

Quase dei uma bolsada na Caroline, viu? Puta merda. A sorte dela é que sou um cavalheiro e não bato em mulher. Mas que deu vontade ... deu! E como deu!

— E agora, o que vamos fazer? — olhei para o Pigmeu. — Você tem celular, mano?

O maluco ficou me olhando e depois respondeu calmamente:

— Acho que tenho, espera aí — e Pigmeu enfiou a mão no bolso da calça. Depois de procurar o celular por quase dois minutos ele finalmente encontrou. — Olha ele aqui.

— Tem crédito?

Pigmeu ficou me encarando novamente. Depois disse:

— Tem o quê?

Tomei o celular da mão do maluco. O bagulho estava todo sujo e melado. Tinha um cheiro estranho pra caralho. Não consegui ligar pra ninguém, afinal de contas nem bateria tinha na porcaria. Fala sério!

Pois é, fodeu.

Foi então que surgiu a idéia de pegarmos carona. O problema é que quase não passa ninguém nesta bosta de estrada. Os únicos dois veículos que passaram nem deram bola para nós. Se um casal trepando não foi capaz de chamar a atenção ...

Tive outra idéia. Apelar para as pernas gostosas de Caroline. Mas quando revelei minha idéia quase levei outra bolsada.

— Vem vindo uma Besta! — gritou Caroline.

— O Pigmeu saiu do Fusca?

— Não — e Caroline apontou para dois faróis que se aproximavam. — , eu quis dizer aquela Besta.

Antes que eu respondesse algo Caroline saltou para fora do Fusca e ficou pulando feito uma maluca e gritando "pare, por favor!". E por incrível que pareça deu resultado. O motorista da Besta encostou o veículo. 

Na verdade eram três Bestas. As três pararam. Elas estavam voltando de uma excursão ao Playcenter. Nem preciso dizer que elas estavam cheias de crianças, né? Putz! Uma gritaria do caralho. Nas duas primeiras não havia lugar pra mais ninguém, mas na terceira havia alguns espaços vagos. Foi aí que conseguimos nossa carona. Caroline trancou seu Fusquinha e prometi voltarmos no dia seguinte para reabastecê-lo. 

Subimos então na terceira Besta. Logo quando entramos a criançada já começou a nos malhar. Uma loirinha de óculos me olhou feio, virou-se para a professora e disse:

— Tia, tia, tia, eles estão fedendo cê-cê!!!

A professora ficou sem graça, não sabia se ria das nossas caras ou se mandava a menina ficar quieta.

Pigmeu viu aquela criançada toda e pirou o cabeção. Sabe-se lá o que foi que ele viu, né? Só sei que ele arregalou aqueles olhos vermelhos e disse:

— Sinistro, olha quantos anões!

Meu, a criançada ficou puta da vida. Jogaram tudo o que tinham em mãos. É claro que também acabei atingido. Jogaram latinhas de refrigerante, sacos de pipoca, canudinhos, pães com presunto, queijo, tudo o que puderam jogar ... jogaram. Só não jogaram a professora porque a maldita era gorda que nem uma baleia encalhada.

O motorista da Besta deu a partida e finalmente conseguimos nos acomodar. Coloquei o Pigmeu bem no canto, perto da janela, assim evito que ele saia por aí dando tapa na criançada, né? Não seria nada bom. Pedalada, Joaninha!!! Já imaginaram? Um tapão daqueles num gurizinho destes poderia causar um traumatismo craniano. Putz! Lembrei da coitada da Carolina.

A viagem começou e tinha um gordinho encarando a Caroline. De repente o moleque me abre a boca e diz isso:

— Seu cabelo é verde?

Caroline sorriu e lhe respondeu:

— É verde sim. Você gostou?

— É esquisito. 

— Preciso concordar com você. É esquisito mesmo.

— Uma vez eu vi um filme — continuou o gordinho.

— É mesmo? Que filme?

— Não lembro o nome, mas tinha uma mulher com os cabelos verdes também.

— E ela era bonita?

— Era uma piranha feia que nem você.

Putz!!! Caroline pegou a bolsa pra bater no gordinho. Se eu não a tivesse impedido ela teria detonado o coitado do moleque.

E assim a viagem prosseguiu ...

Num determinado trecho a professora resolveu ter a brilhante idéia de cantarmos algumas músicas. Era só o que faltava. E lá fomos nós ...

O Jipe do padre fez um furo no pneu ...

O Jipe do padre fez um furo no pneu ...

O Jipe do padre fez um furo no pneu ...

Colemos com chiclé!!!

 

A Japa da padra faz a fara na paná

A Japa da padra faz a fara na paná

A Japa da padra faz a fara na paná

Colemos com chiclé!!!

 

E Jepe de pedre fez e fere ne penê

E Jepe de pedre fez e fere ne penê

E Jepe de pedre fez e fere ne penê

Colemos com chiclé!!!

 

E por aí foi ...

Só sei que quando eu desci da Besta eu já estava prestes a matar uma daquelas crianças malditas dos infernos. Se eu ouvisse aquela musiquinha do Jipe outra vez eu juro que ia meter a mão até na gorda da professora. Putz, vou ter pesadelo com esta musiquinha por uns seis meses.

 

Caroline não queria voltar para casa. Pra não deixá-la sozinha aquela noite eu fiquei ao seu lado. Passamos a noite na casa do Pigmeu. Um moquiço do caralho. Até as paredes da casa tinham cheiro de lança-perfume. Mas ... estávamos tão cansados que capotamos no sofá e só acordamos às dez horas da manhã do dia seguinte.

Acordei com a Caroline rindo no meu ouvido.

— Pára, Nando! Está me fazendo cócegas! Pára!

— Acabei de acordar, não estou fazendo nada!

— Mas então .... ?

Caroline pulou quase dois metros de altura. Tinha uma ratazana enorme sobre as pernas dela. Caralho, o bicho era tão grande que parecia um cachorro. O grito de Caroline foi tão alto que a ratazana saiu fincando pelo corredor.

Depois procuramos algo pra tomarmos um café da manhã, mas não havia nada ... digamos ... nutritivo. Meu, como é que o Pigmeu consegue sobreviver?

Deixamos a casa do maluco. Nem pudemos agradecer pela hospitalidade. Não havia o menor sinal do Pigmeu. Evaporou que nem peido.

Entramos na primeira padaria que encontramos. Estávamos famintos! Cada um comeu três coxinhas e tomou duas garrafinhas de refrigerante.

— O que vai fazer agora? — perguntei.

— Voltar pra casa. Minha mãe deve estar dando cria. Mas antes ... lembra do segundo item da lista?

— Deixe-me ver ... a tatuagem?

— Isso. Não volto pra casa sem fazer minha tatuagem.

Por um acaso eu tinha um amigo que possui um estúdio não muito longe dali. Seu nome é Marcio, mais conhecido por Podrão.

E lá fomos nós para o estúdio do Podrão. Caroline ficou encantada com o lugar. Havia tantas tatuagens diferentes. Uma mais legal que a outra. Ela não sabia qual escolher. Foi aí que ela virou pra mim e disse:

— Até quanto você pode pagar?

— Como assim?

— Ué, você vai pagar a tatuagem pra sua gatinha, não vai?

Putz!!! Mulher é foda. Bicho liso que nem sabonete. O que eu poderia fazer? Disse que sim, né? Eu ainda estava com os quinhentos paus na carteira. Devo estar muito apaixonado mesmo. Só pode ser isso.

— Mas então escolhe logo, né? — falei. — O Podrão não pode ficar aqui esperando por você o dia todo.

— Eu estou indecisa demais. Bom, já que é você que vai pagar ... não quer escolher por mim?

— Não, eu acho melhor você escolher. Tatuagem é algo importante. Vai que depois você não gosta e ...

— Bobo! Se é você que vai escolher ... vou gostar sim!!! Escolhe pra mim!

— Bom, você que sabe. Mas depois não vá reclamar, hein!

— Não vou. Olha, faz uma surpresa pra mim. Vou esperar lá dentro. Só quero ver a tatuagem depois de pronta. Confio no seu bom gosto, tá?

Caroline me deu um selinho e correu pra dentro do estúdio, empolgadíssima. Podrão veio falar comigo. Meu, o Podrão tem tanta tatuagem pelo corpo que fica difícil até pra achar onde fica os olhos do cara.

— Gostosa a sua mina, Nando — disse ele.

— Olha o respeito, Podrão.

O cara caiu na gargalhada. Maldito Podrão dos infernos. Só tenho amigo escroto, já perceberam?

— Mas diz aí, ela já escolheu qual tatuagem vai fazer?

— Deixou pra que eu escolhesse.

— Xiiii, é fria, mano. Isso nunca dá certo. 

— Também acho, mas ...

Neste momento Pezão aparece na porta do estúdio.

— Porra, nem acredito que achei você! — disse ele, bufando. Depois olhou para o Podrão. — Fala, grande Podre ... firmeza, irmão?

— Firmeza, Pezão. Está sumido, cara.

— Mas que diabos você está fazendo aqui? — perguntei.

— Nando, sua mãe está desesperada atrás de você, cara! Ela me encheu tanto que enquanto não saí pra te procurar ela não me deixou em paz. Por que desligou o celular? Você vem comigo ... agora!!!

Podrão ficou puto.

— Oh, mano, vai escolher a tatuagem pra sua mina ou não?

— Tatuagem? — disse Pezão, surpreso. — Sua mina? Do que o Podrão está falando? Ah, então é por isso que você sumiu ... estava com alguma pé-vermeio, né?

— É uma lonnnnnga história — olhei para o Podrão e disse: — Pega a mais barata e manda bala. Beleja?

E o filho da puta do Pezão foi me empurrando pra fora do estúdio. Antes de sair eu ainda falei para o Podrão:

— Diz pra ela que eu precisei sair, mas volto mais tarde pra ver como ficou.

Podrão fez sinal de positivo e nos despedimos.

Galera, cheguei em casa e minha mãe estava mais branca que um copo de leite. Tadinha, estava desesperada. Obrigou-me a tomar um café reforçado. Por incrível que pareça nem me interrogou tanto. Falei que tinha passado a noite na casa de uma ex-namorada e ela acabou engolindo a história. Ou fingiu que engoliu, sei lá.

Depois do café que eu não queria tomar deitei-me na minha cama e desabei. Acordei depois do almoço. Tomei um bom banho. Troquei de roupa, chamei um táxi e fui desesperado para o estúdio do Podrão, rezando para que a tatuagem ainda não estivesse pronta.

E não estava. Cheguei bem na hora! Ufa!

Entrei sorrateiramente no estúdio. Podrão estava tatuando a nuca de Caroline. Fui aproximando-me na ponta dos pés e beijei o rosto da minha gata dos cabelos verdes. Ela tomou um susto tão grande, pobrezinha.

— Bobo! Quase me mata do coração, oh! O que aconteceu? Aonde foi?

— Minha mãe também estava dando cria com o meu sumiço.

— Putz, a minha deve estar arrancando os cabelos. E o meu pai também!

— Meu, quando vai terminar isso?

— Já está pronta — respondeu Podrão. — , eu já estou nos últimos retoques.

Dei a volta para ver o que o Podrão havia tatuado. Quando vi não pude controlar o espanto. Quase caí duro no chão.

— Putz grila!!! — falei, e depois me arrependi.

Caroline ficou preocupada com a minha reação. Por isso que me arrependi.

— O que foi? — ela disse, parecendo afliga. — Ficou feia? O que foi? Você não gostou? Mas .. foi você que escolheu! Não gostou?

— Calma, meu anjo, fi ... ficou linda! Show de bola!

Não sei se consegui convencê-la. Aposto que não.

— Não mente pra mim, Fernando!

Fernando? Nossa, não me lembro dela ter me chamado pelo nome alguma vez.

— Ficou muito sexy — afirmei. — até fiquei arrepiado.

Caroline sorriu e ficou um pouco mais calma. Quem não ficou calmo fui eu. Chamei Podrão para uma conversinha particular.

Saímos do estúdio. Colei Podrão na parede e já fui desabafando:

— Meu, você tatuou uma barata na nuca dela!!!

— Sim, e daí?

— Cara, uma barata? Uma barata?

— Ué, não foi o que você me pediu?

— Podrão, eu pedi pra fazer a tatuagem MAIS barata ... não pra tatuar uma barata!!!!

— Então, foi o que eu fiz ... tatuei uma barata.

— Não, porra!!! Não era pra tatuar uma barata!!!

— Meu, você está exagerando. Ficou show de bola a barata.

— Show de bola? Podrão, você comeu cocô???? Pra piorar ... barata ficou tão real que eu quase pensei que tinha um inseto em cima da tatuagem.

— Obrigado. Eu sou foda mesmo. Ficou real pra caralho, né? Teve um momento que eu saí pra mijar e quando voltei pensei que tinha uma barata de verdade em cima dela. Quase dei uma chinelada na tua mina. Com todo o respeito, é claro.

Meu, quase soquei a cara do filho da puta. Só não arrisquei porque o desgraçado é campeão estadual de judô. 

Pra piorar a situação ainda tive que pagar pelo serviço. Ninguém merece. Acho que eu joguei cocô na cruz mesmo.

Não tive coragem de mostrar a tatuagem pra Caroline. Enrolei a coitada de todos os jeitos. Entramos num táxi e ela começou a desconfiar de que tinha alguma coisa errada. Só não fazia idéia do que poderia ser. Meu, o que vai acontecer quando ela descobrir que tem uma barata tatuada na nuca?

— A tatuagem ficou feia, não ficou? — repetia ela, sem parar. — A sua cara diz tudo, Nando! Você não gostou, não é?

— Gostei sim, meu anjo! Eu juro que gostei.

— E por que não quer me deixar ver?

— Você não sabia que dá azar olhar a tatuagem logo quando termina? Vai por mim, um amigo meu fez isso e até hoje ele só toma no cu. O cara pegou mó azar.

— Você está me enrolando, isso sim. Nunca ouvi ninguém dizer isso.

— Acredite em mim.

Bom, vocês sabem que os pais da Caroline me odeiam de morte, né? Então o táxi parou a alguns quarteirões da casa dela e de lá ela partiu sozinha. Nossa despedida foi tão fria. Ela estava fula da vida comigo. Logo que desceu do carro Caroline prendeu os cabelos e sua nuca ficou exposta. A tatuagem parecia viva no corpo dela. O motorista do táxi tomou um puta susto quando olhou pra ela.

— Moço, tem um bicho na nuca da sua namorada!

Por sorte a Caroline não ouviu. Seguiu seu destino, nem olhou para trás.

Fiquei tão mal aquele dia. Senti-me tão culpado. Eu deveria ter contado a verdade a respeito da tatuagem. Fiquei triste pra caralho quando lembrei da nossa despedida tão amarga. Senti que finalmente eu me importava com alguém. Senti que pela primeira vez meu coração acelerava só de pensar neste alguém. E este alguém era Caroline, a menina dos cabelos verdes.

Não consegui dormir aquela noite. Pensei nela o tempo todo. Eu queria ligar para pedir desculpas, mas tinha medo dos pais atenderem o telefone.

No dia seguinte acordei cedinho e fui tomar meu café. Eu não agüentava mais ficar na cama, rolando de um lado para o outro sem parar.

Sentei-me à mesa. Minha mãe estava de pé também, encostada na pia da cozinha, lendo o jornal local.

— Bom dia, mãe. Bênção.

— Deus lhe abençoe, meu filho. Dormiu bem?

— Sim.

Se eu dissesse que não ... começaria um interrogatório enorme. Conheço minha mãe.

— Que coisa horrível!!! — disse ela, de repente. Tomei um puta susto.

— O que foi, mãe?

— A página policial tem uma matéria terrível.

Provavelmente seja a história do suicídio do Milton, né?

— O que aconteceu? — perguntei, fingindo não saber de nada.

— Deixa pra lá. Tome seu café sossegado.

— Conta, mãe. O que diz a matéria?

— Você que sabe. Se perder o apetite a culpa é sua. Bom, aqui diz que ontem uma moça aqui da cidade morreu a golpes de vassoura. 

Ufa! Nada a ver com o Milton.

— Caraca. Vassoura?

— Não, vai vendo ... a moça chegou em casa e a mãe viu uma barata na sua nuca. Cruz credo! Resultado, a mãe entrou em pânico, pegou uma vassoura e tentou tirar a barata de cima da filha. Acontece que não era uma barata, era apenas uma ...

— Tatuagem.

— Isso. Mas como você sabia?

— Mãe — e uma lágrima escorreu do meu olho direito. — , é uma lonnnnnga história.

( FIM )